8.2.07

Isabel

levanto-me todos os dias às cinco horas. da manhã, sendo que é sempre noite.
preparo as coisas para o pequeno almoço dos miúdos e saio depois de um café bem forte.
entre bêbedos e indigentes, a vida da madrugada é tranquila e apesar de apressados, os passos parecem feitos em câmara lenta
aproveito-os
trabalho num matadouro
depois do ponto vou para o quarto vestir a bata, o avental de plástico e as luvas amarelas
o cheiro a carne morta ainda me perturba nos primeiros segundos, depois não
são frangos
na linha já só me aparece um tronco pálido com quatro extremidades ridículas
os frangos são patéticos
sou das que lhes enfia a mão por entre as patas
qual autómato
enfio
rodo o pulso
e tiro a mão já cheia de entranhas
é tudo o que faço

tenho os pulsos moídos
as dores no direito ensinaram-me a usar o outro

se pensar bem
é como o flamenco
dores e pulsos rodados
dentro de luvas amarelas

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